Liberdade de Expressão

 

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terça-feira, setembro 30, 2003

 
O mundo está de pernas para o ar

Pois é, o mundo está de pernas para o ar.

O Blackout italiano teve direito no Público a uma pequena notícia nas páginas interiores. O Blackout americano teve direito a primeira página, destaque e editorial (Só na América, na Europa seria impossível). Isto é muito estranho. O previsível blackout americano merece todo o destaque, mas os improváveis blackouts europeus são praticamente ignorados. O cão que morde no homem é notícia, mas o homem que morde no cão não é.

Afinal os portugueses morrem há anos de frio. Morrem mais de frio do que de calor. Com o Aquecimento Global a situação só pode melhorar.

Os alemães não estão satisfeitos com a energia eólica. O governo de esquerda está preocupado com os custos económicos (devem ser neoliberais), os sindicatos estão preocupados com o desemprego no sector energético convencional (é o dinheiro acima da ecologia) e os ecologistas dizem que os geradores eólicos são feios, porcos e maus (é a ecologia acima da ecologia).





sábado, setembro 27, 2003

 
Ranking das escolas

Que ideia maluca.

Só pode ter saído da cabeça dos liberais.

Onde é que já se viu. A sociedade civil tem acesso e pode tratar e interpretar livremente informação produzida pela Administração Pública.

Qualquer Zé Ninguém o pode fazer.

Daqui a pouco, até vão dar liberdade aos alunos para mudar de escola e às escolas para tentarem subir no Ranking.

Daqui a pouco as escolas mal classificadas vão ficar às moscas.

Daqui a pouco, as escolas vão ter que fechar só porque são más.

Daqui a pouco, as escolas até vão começar a despedir professores incompetentes para subirem no Ranking.

Querem dar ao Zé Povinho o poder de decidir o que tem valor e o que não tem. Onde já se viu. O Zé Povinho é um inculto que não frequenta a ópera. Ele nunca poderá saber o que é melhor para si próprio.

Daqui a pouco são os Vouchers.

É o caos.

Burgueses egoístas, ou "ambiciosos" aspirantes a burgueses, que se recusam a pagar impostos para financiar as escolas que têm a infelicidade de não produzirem resultados.


 
Só na América: blackout na Escandinávia

Como coisas destas só acontecem na América, ninguém reparou no Blackout escandinavo. Como todos sabemos, o blackout americano deveu-se às políticas americanas de desregulamentação do sector eléctrico. Tudo culpa do neoliberalismo. Uma coisa destas não poderia ter acontecido na Europa. O pior é que aconteceu. Duas vezes. Primeiro no Reino Unido e agora na Escandinávia.

E também ninguém reparou neste blackout na Malásia, neste na Tasmania, neste em Camberra ou neste na Nigéria.

Como diria o Terras do Nunca, as críticas à rede eléctrica americana são perfeitamente normais e não podem ser consideradas um sintoma de anti-americanismo. O que não se percebe é a obsessão pelos Blackouts americanos quando há blackouts por todo o mundo. Inclusive, no paraíso escandinavo da social-democracia.

 
Estado privatiza dívidas ao fisco

Pelo que percebi de uma notícia de hoje no Público (não há link), o governo planeia privatizar as dívidas ao fisco e à segurança social. A ideia é belíssima. O estado vende as dívidas no valor de 200 M por 100 M ao BCP. O estado recebe imediatamente o dinheiro. Como algumas dívidas são incobráveis, o BCP, pode ter lucro, ou não. Para ter lucro terá que contratar o Cobrador do Fraque para sacar o dinheiro ao Benfica e à Casa do Douro. Entretanto o governo livra-se da pressão política dos 6 milhões de benfiquistas e dos milhares de agricultores da região do Douro.

 
A péssima imagem dos políticos é da responsabilidade dos próprios -- reposição e actualização


De vez em quando, alguém resolve declarar que os ataques indiscriminados à classe política são demagógicos. Mas a verdade é que são os próprios políticos que não contribuem para separar o trigo do joio. Graças ao sistema de listas partidárias e ao sistema eleitoral, os bons políticos vão parar à mesma lista dos maus e o eleitor não tem como os separar. E mesmo quando um determinado político mete a pata na poça, os seus pares calam-se e não se distanciam. Foi o que aconteceu no caso Maria Elisa, como bem lembra o Mar Salgado (post "POIS É").

O caso Maria Elisa é daqueles casos delirantes que mostram que a consideração que determinados políticos têm pelos seus eleitores:

1 - Maria Elisa sofre de uma doença crónica: fibromialgia. Esta doença provoca dores musculares e fadiga permanentes;


2 - Em 2002 Maria Elisa já tinha fibromialgia, mas aceitou candidatar-se a deputado à mesma;

3 - Aceitou ser deputada pára-quedista por Castelo Branco alegando ligações ao distrito: terá dado umas aulas em Abrantes;

4 - Depois de eleita tentou acumular o cargo e o salário na RTP com o cargo e o salário de deputada (e se calhar umas aulitas em Abrantes), apesar da doença crónica;

5 - Mas acabou por não o fazer por causa das incompatibilidades;

6 - Agora, Maria Elisa sentiu-se doente e resolveu suspender o cargo de deputada voltando à RTP. Trabalhar na RTP ainda cansa menos que trabalhar no parlamento;

7 - Como prémio, o nome de Maria Elisa passou a ser falado para a UNESCO.

8 - Ribeiro Cristóvão, o próximo na lista, é o substituto de Maria Elisa, mas diz que só deu o nome dele para enganar o eleitor. Não tencionava exercer o cargo.

9 - Maria Elisa resolveu dizer que estava a ser persiguida por ser mulher. Pois ...

10 - Poucos foram os políticos nacionais que fizeram críticas públicas a Maria Elisa, Ribeiro Cristóvão ou a quem os seleccionou para deputados.

11 - Maria Elisa passou a ser falada para o cargo de Adida Cultural em Londres.

12 - Soube-se entretanto que Maria Elisa não está doente, mas que suspendeu o mandato de deputada porque precisava de fazer tratamentos preventivos.

13 - António Costa do PS resolveu minimizar o comportamento de Maria Elisa e a comissão de Ética da Assembleia da República resolveu critícar o deputado Vicente Jorge Silva, um dos poucos que criticou Elisa.

14 - Ninguém conseguiu ainda perceber se Maria Elisa tinha objectivos políticos quando se candidatou a deputada. Se tinha, ficamos sem saber se esses objectivos foram atingidos ou não.

15 - Nas próximas eleições, os eleitores de Castelo Branco vão votar noutro pára-quedista qualquer.

16 - Hoje, o Mar Salgado informa que Maria Elisa afinal não vai para adida cultural em Londres. Vai para adida de imprensa em Londres. Não pode ir para adida cultural porque não é licenciada (mas então, e as aulas em Abrantes?). Ou antes, teoricamente vai para adida de imprensa, mas na prática vai desempenhar as funções de adida cultural. Mas pera lá, a adida cultural não tem que ser licenciada?

17 - A Mariana Relativa ainda considera a primeira versão deste post um discurso anti-política e anti-parlamento. Engana-se. Comportamentos como os de Maria Elisa é que são anti-política e anti-parlamento.

18 - Mas Portugal precisa de uma adida de cultural em Londres? E Maria Elisa é a pessoa ideal para o cargo? Não se cansará demasiado? Será tão boa adida cultural como foi boa parlamentar? Desistirá do cargo a meio? Vai para Londres para fazer tratamentos, ou vai para trabalhar? Que é que isso interessa? Como diria o Crítico Musical isso são detalhes que só interessam aos «burgueses egoístas, ou aos "ambiciosos" aspirantes a burgueses, que se recusam a pagar impostos para dar a Maria João Pires um local digno para criar disciplos e escola.»

19 - Conclusão: alguns portugueses têm direito a pequenas viagens de helicóptero, outros têm direito a grandes viagens de helicóptero e alguém terá de as pagar.

 
Notas sobre a concentração dos Media

1 - Miguel Sousa Tavares está preocupado com a concentração dos Media , o que em princípio tem como consequência política inevitável a imposição de limites ao normal funcionamento do mercado. No entanto, é o próprio MST que nos informa que o problema não é o mercado mas a intervenção do estado, o qual concedeu vários monopólios à Portugal Telecom.

2 - Os monopólios da PT, por sua vez, foram justificados no passado por preocupações igualmente importantes como a garantia do serviço público universal ou a defesa dos centros de decisão nacionais.

3 - Nos anos 80, a esmagadora maioria dos órgãos de comunicação pertenciam ao estado ou à Igreja Católica. As televisões e as rádios privadas eram proibidas. Muitos dos que agora se preocupam com a concentração dos Media, na época eram acérrimos defensores da situação.

4 - O monopólio estatal dos meios de comunicação social foi justificado no passado com os mesmos argumentos que agora são utilizados para limitar as concentrações. Estranho, não é?

5 - Actualmente, as televisões privadas gozam de uma situação de duopólio que seria destruído se o Canal 2 fosse concessionado a um operador privado. No entanto, esta medida que contribuiria para a desconcentração dos Media não parece ser muito popular.

6- Continuam a existir barreiras artificiais ao desenvolvimento de novos Media. Uma das licenças de telemóveis foi metida na gaveta e ainda existe uma frequência de televisão por atribuir. Esta frequência devia ser atribuída a canais regionais de televisão.

7- Estão a aparecer novos Media como a Internet, a TV por cabo, os telemóveis de 3ª geração, a rádio e a televisão digital . Estes novos Media tornam alguns dos argumentos contra a concentração dos Media obsoletos. O Abrupto já atingiu 185 000 pageviews. As barreiras à entrada no mercado de comunicação são cada vez menores, e só não são mais pequenas porque o estado impõe barreiras artificias Os múltiplos canais de comunicação e o acesso aos meios de comunicação estrangeiros são um limite efectivo aos abusos.

8- Curiosamente, algumas das pessoas que estão preocupadas com a concentração dos Media são as mesmas que estão preocupadas com a ditadura das audiências. Das duas uma, ou os capitalistas sem escrúpulos conseguem impor a sua agenda ao público ou essa agenda é imposta pelo público. As duas coisas juntas é que não faz sentido nenhum.


sexta-feira, setembro 26, 2003

 
Palestinianos recusam executar missões contra civis

“Vinte e cinco palestinianos do Hamas recusam executar missões em território israelita, tendo entregue uma petição nesse sentido ao seu comandante, revelou quarta-feira a rádio pública palestinianos. (…) As acções das forças palestinianos com homens bomba visando alvos israelitas causam unicamente vítimas entre os civis. A 25 de Janeiro de 2002, 52 membros veteranos do Hamas já tinham anunciado que não iriam operar mais em territórios israelitas. «Não continuaremos a combater além da linha verde (nos territórios palestinianos) com o objectivo de oprimir, expulsar, esfaimar e humilhar um povo», escreveram, numa petição que reuniu várias centenas de assinaturas e suscitou viva polémica nos territórios palestinianos."

(notícia fictícia inspirada numa notícia verdadeira da LUSA)

quinta-feira, setembro 25, 2003

 
Mas afinal, funciona, ou não funciona ?

O Tribunal Constitucional acaba de dar à defesa de Paulo Pedroso no caso da recusa de recurso por parte da relação. Podem-se tirar muitas lições deste caso, mas não aquelas que os Mata Mouros procuram retirar aqui e aqui.

Os liberais defendem a tese extraordinária segundo a qual os seres humanos são falíveis e limitados... Sendo assim, um sistema legal que dependa exclusivamente das decisões de uma só pessoa é ele próprio falível e limitado. Felizmente, existem soluções muito bem testadas para estes problemas.

Um bom sistema legal é um sistema que não depende de uma decisão específica de um único homem. Um bom sistema legal é um sistema que possui mecanismos de autocorrecção que minimizam as consequências dos erros cometidos por determinados agentes.

Só se pode concluir que um sistema é mau se for cometido um erro e se esse erro não for corrigido. Por isso, um eventual erro cometido por um agente específico num caso específico não pode ser usado para concluir que o sistema não funciona.

No caso presente, a primeira decisão da Relação acaba de ser corrigida pelo Tribunal Constitucional. Quem pensa que a primeira decisão foi uma má, tem agora que concluir que o sistema funciona e que sempre funcionou porque o Constitucional também faz parte do sistema. Tudo indica ainda que, quem pense que o Juiz Rui Teixeira tomou uma má decisão ao antecipar a revalidação da prisão preventiva não pode usar esta decisão para confirmar a sua tese. Segundo as informações disponíveis até ao momento, o Tribunal Constitucional defende que o Tribunal da Relação cometeu um erro, mas até agora nada foi dito sobre a posição do Tribunal Constitucional em relação à decisão de Rui Teixeira.

Muitas das críticas que são habitualmente feitas ao sistema judicial baseiam-se em casos específicos e em decisões específicas tomadas por juízes específicos. Estas críticas baseiam-se na tese racionalista segundo a qual a mente de uma única pessoa é suficientemente poderosa para decidir sobre temas complexos. Isto é um erro. Problemas complexos só podem ser resolvidos por sistemas complexos compostos por vários níveis e com mecanismos de autocorrecção. Um bom sistema complexo é um sistema que toma decisões melhores que as melhores decisões do melhor dos seus membros. Um bom sistema judicial é necessariamente um sistema onde se cometem erros. Os erros fazem parte do processo de aprendizagem do sistema como um todo.


terça-feira, setembro 23, 2003

 
A importância do voto com os pés

Diz o Fumaças:

DEMOCRACIA?

Muito interessante o conceito de democracia de alguns: bastou perderem as eleições para a SPA (Sociedade Portuguesa de Autores) para virem logo insinuar o lançamento de outra organização similar!

VERGÜENZA EN USTED, SEÑOR SARAMAGO


Nada mais democrático. Numa democracia liberal, todos têm o direito a votar com os pés sempre que isso é possível. Quem está em minoria numa organização tem sempre o direito de criar uma organização alternativa. Este é o único mecanismo que limita verdadeiramente o poder da maioria.

sábado, setembro 20, 2003

 
Constituição Europeia

O PG do Bloguitica Nacional insiste que eu fale da Constituição Europeia. Cá vai:

1 – As sociedades são vulneráveis ao abuso de poder de alguns dos seus membros sobre os restantes.

2 – São várias as ameaças à liberdade e à democracia: os ditadores, os fanáticos religiosos, as burocracias, a aristocracia política, as maiorias ou as minorias poderosas.

3 – As ameaças à liberdade e á democracia são tanto maiores quanto maior for o tamanho da entidade política.

4 – Os mega-estados federais são particularmente vulneráveis aos abusos dos burocratas, das elites dirigentes, das maiorias e dos estados mais poderosos.

5 – Uma boa constituição é uma constituição que estabelece regras capazes de impedir os mais que prováveis abusos de poder.

6 – A Constituição Europeia, em vez de instituir regras que limitem os poderes dos burocratas, das elites dirigentes, das maiorias ou dos estado mais poderosos, é uma constituição que institucionaliza esses poderes.

7 – A Constituição Europeia atribui competências quase ilimitadas à União. A União tem competências sobre pescas, energia, agricultura, ambiente, defesa dos consumidores e coesão económica e social. Tendo competências nestas áreas, a União adquire poderes para regular uma grande fatia da vida pública europeia.


8 – Claro que, em teoria, a União é limitada pelo princípio da subsidiariedade. Mas este princípio não impede a União de criar políticas de harmonização das regras que mais não são que um entrave à livre competição entre espaços geográficos com características diferentes. As competências sobre ambiente, defesa do consumidor e coesão social podem servir para justificar qualquer coisa.

9 – A própria constituição abre as portas para as tais políticas de harmonização ao justificar interferências da União com ganhos de escala. Os ganhos de escala podem servir para justificar tudo.

10 – A própria constituição estabelece a União Europeia como um estado social. O socialismo deixa de ser uma opção política em livre competição com muitas outras para passar a ser obrigatório.

11 – Como a União tem competências quase ilimitadas, nenhum outro mecanismo poderá impedir abusos de poder. Num sistema político representativo, quanto maior for a distância entre eleitos e eleitores mais dificil se torna o controlo demcrático dos eleitos. Os controlo dos eleitos através de poderes e contrapoderes não é suficiente porque poderes e contrapoderes são muitas vezes tentados a acordar consensos.

12 – A própria constituição é já um reflexo dos abusos de poder por parte das elites políticas. A Constituição atribui mais poderes ao Conselho Europeu do que ao Parlamento Europeu. Mas de qualquer das formas isso não interessa muito porque o Parlamento é o reflexo dos mesmos equilíbrios de poder que geram o Conselho.

13 – Os membros do conselho são representantes do interesse nacional e têm que negociar entre si os mais variados assuntos. O resultado inevitável deste arranjo será, na maior parte dos casos, a imposição da vontade dos interesses dos países mais poderosos aos países menos poderosos. Este mecanismo de decisão tenderá a contornar os próprios parlamentos nacionais.

 
Alta política na Blogosfera

Na boa tradição iniciada pela Coluna Infame foram publicados esta semana vários artigos sobre política de qualidade particularmente elevada:



São estes artigos que tornam a qualidade da discussão política na Blogosfera superior à qualidade da discussão política nos outros media. No dia em que artigos como estes deixarem de aparecer, a Blogosfera limitar-se-á a reproduzir os vícios da vida política nacional.

quinta-feira, setembro 18, 2003

 
As razões das autoridades

Diz o Abrupto, a propósito do Blog-que-ninguém-linka:

E ainda estou por perceber por que razão as autoridades, que têm a obrigação de combater o crime, permanecem olimpicamente indiferentes.


Há várias hipóteses explicativas:


  • As autoridades estão a investigar. Uma boa polícia parece sempre olímpicamente indiferente até ao dia em que apanha o criminoso;
  • As autoridades chegaram à conclusão que os escassos recursos disponíveis são mais úteis noutros casos;
  • As autoridades não estão interessadas em dar ainda mais relevo ao caso;
  • As autoridades chegaram à conclusão que não foi cometido nenhum crime público e estão à espera de uma queixa;
  • Ninguém se queixou porque ninguém está interessado em dar ainda mais relevo à questão;

quarta-feira, setembro 17, 2003

 
Novas utopias

Diz o Aba de Heisenberg:

Houve uma perturbação na web que a fez vibrar em todo o lado, tal como uma teia de aranha. E é bom ver que há um super-media a nascer, o dos mails+blogues, o dos media que todos nós agora podemos ser, super-media esse que propaga preferencialmente ideias interessantes, em vez de propagar ideias desinteressantes pagas por quem tem dinheiro e poder (a publicidade dos media convencionais). Tudo isto irá evoluir, não sei como. Haverá certamente tentativas para controlar este super-media, mas esperemos que ele continue incontrolável e útil.


Acho que já é mais ou menos claro que o problema não é nem a velocidade de circulação, nem o interesse, nem o controlo das ideias. O problema é que as ideias interessantes não são necessáriamente verdadeiras. O Blog-que-ninguém-linka está aí para o demonstrar. Lixo interessante que ninguém controla e que se propaga a grande velocidade continua a ser lixo. O problema principal da informação continua a ser o mesmo de sempre: como é que se distingue a boa da má?

 
Procuradoria desmente Van Krieken ?

Antecipação aqui

 
Mistérios da Blogosfera desvendados

Este Blog é uma sátira. Quem se lembra da Balbina Silvão?

Este Blog era uma piada. Não sei de quem. Falem com os meninos casadoiros.

Não vou revelar quem é o Pipi, mas o Pipi está de alguma forma relacionado com o que se passou em Braga no dia 16 de Outubro de 1965.

 
Apareceu o Gastão

Notícia do dia. Por favor, passem-no por um detector de escutas.

 
Braga, 16 ou 17 de Outrubro de 1965

Este livro inspirou este senhor.

 
Explicação bidireccional

Diz JPH do Glória Fácil:

Cinquenta anos de silêncio salazarista fazem com que este ódio aos jornalistas - tal como, aliás, o ódio ao parlamentarismo e aos políticos que mais se expõem nesse sistema - tenha ainda raízes profundas na sociedade portuguesa. O jornalismo, como o parlamentarismo, vive do conflito, da exploração das dissonâncias, desasossega, inebria-se com o cheiro da pólvora. E não é em 30 anos de democracia, os primeiros dos quais bastantes tempestuosos, que se "ensina" a um país que a "anormalidade" faz parte da normalidade - que as coisas são mesmo assim e é melhor que assim sejam porque senão, caso contrário, morremos todos outra vez de pasmo, orgulhosamente sós.


Claro que a mesma explicação pode ser aplicada a este post do JPH. Ora vejam:

Cinquenta anos de silêncio salazarista fazem com que as criticas aos jornalistas - tal como, aliás, as criticas ao parlamentarismo e aos políticos que mais se expõem nesse sistema - provoque reacções corporativas por parte das comunidades jornalistica e política. A discussão pública, como o jornalismo ou parlamentarismo, vive do conflito, da exploração das dissonâncias, desasossega, inebria-se com o cheiro da pólvora. E não é em 30 anos de democracia, os primeiros dos quais bastantes tempestuosos, que se "ensina" a um país que a "anormalidade" faz parte da normalidade - que as coisas são mesmo assim e é melhor que assim sejam porque senão, caso contrário, morremos todos outra vez de pasmo, orgulhosamente sós.

 
Beber vinho dá de comer a um milhão de portugueses


O estímulo da economia através do estímulo do consumo parece ser uma ideia muito popular. O Cruzes Canhoto fala da contribuíção dos estudantes para a economia nacional através do consumo de cerveja.

O Cruzes também nos informa sobre a política económica de Allende:

In his first year, Allende also employed Keynesian measures to hike salaries and wages, thus pumping up the purchasing power of the middle and working classes. This "consumer revolution" benefited 95 percent of the population in the short run because prices were held down and employment went up. Producers responded to rising demand by employing previously underused capacity.


Entretanto o Mar Salgado afirma:

Não é difícil perceber a grande relevância do sistema prisional para a economia americana (boa parte dos serviços é prestada pelo sector privado).


E no entanto, quando o Abrupto discute imigração não recorre ao argumento do consumo:

E depois, o mais grave: convinha que alguém no PP, que saiba alguma coisa sobre imigração e emprego, dissesse ao dr. Portas que em Portugal, em 2003, essa correlação não tem qualquer sentido. Os trabalhadores da Marinha Grande ou as operárias da Clark's não vão trabalhar para a construção civil ou como empregadas domésticas. Os ucranianos e as cabo-verdianas, os moldavos e as são-tomenses não competem com os portugueses e as portuguesas nos empregos que têm, a não ser residualmente.



JPP aceita a premissa da extrema-direita de que o número de empregos numa economia é fixo. No entanto, os imigrantes são também consumidores e gastam parte do seu salário. O acréscimo de agentes a uma economia causa uma expansão global dessa economia: aumenta o número de produtores de riqueza, aumenta o número de consumidores e aumenta o número de empregos.

Por outro lado, a expansão do consumo de um determinado produto não gera riqueza. Isto porque os consumidores só podem consumir riqueza equivalente à que produzem. Se alguém passa a beber vinho para dar de comer a 1 milhão de portuguesas tem que deixar de consumir outra coisa qualquer, matando à fome outro milhão, ou então tem que se endividar. Se se endividar terá que consumir menos no futuro, o que vai dar mais ou menos ao mesmo.

As prisões americanas não podem representar nenhum peso especial na economia americana só porque consomem recursos. O consumo não gera riqueza. A riqueza tem sempre que ser produzida por alguém. As prisões acabam por ser um peso para a economia americana, porque as pessoas que lá estão produziriam (e consumiriam ) muito mais se estivessem fora da prisão.

Finalmente, as medidas do Allende para estimular o consumo através do aumento dos salários também não contribuem para a produção de riqueza. É óbvio que numa primeira fase, os recursos sub-utilizados passam a ser utilizados. Mas esses recursos estavam sub-utilizados por uma boa razão: a sua utilização não era considerada economicamente viável. Esta medida produz inflação porque o valor da riqueza produzida a mais é inferior ao aumento dos salários.

 
Fósseis vivos

Artigos que o CDS quer retirar da Constituição


Portugal preconiza a abolição do imperialismo, do colonialismo e de quaisquer outras formas de agressão, domínio e exploração das relações entre os povos, bem como o desarmamento geral, simultâneo e controlado, e a dissolução dos blocos político-militares. (Art.º 7.º, n.º 2)

Incumbe prioritariamente ao Estado (...) contrariar as formas de organização monopolistas e reprimir os abusos de posição dominante e outras práticas lesivas do interesse geral. (Art.º 81.º, alínea e)

A lei disciplinará a actividade económica e os investimentos por parte de pessoas singulares ou colectivas estrangeiras, a fim de garantira sua contribuição para o desenvolvimento do País e defender a independência nacional e os interesses dos trabalhadores. (Art.º 87.º)

Sem prejuízo do direito de propriedade, o Estado promoverá, nos termos da lei, o redimensionamento das unidades de exploração agrícola com dimensão inferior à adequada do ponto de vista dos objectivos da política agrícola. (Art.º 95.º)

terça-feira, setembro 16, 2003

 
Filosofia fora da Lei

Os bolds são meus, o resto é do Jornal Expresso, 06.09.2003

O PROGRAMA de Filosofia do 10º e 11º ano está a ser alvo de um pedido de declaração de inconstitucionalidade. A inédita iniciativa é da Fundação Portuguesa de Filosofia - uma entidade ainda em fase legal de criação - que considera que o programa atenta contra a Constituição, na parte em que esta garante que o «Estado não pode programar a educação e a cultura segundo quaisquer directrizes filosóficas, estéticas, políticas ideológicas ou religiosas».

A queixa foi entregue, para apreciação, no gabinete do provedor de Justiça pelo dirigente da comissão instaladora da nova fundação, Pedro Almeida. Em causa, segundo este docente, está o facto de o programa afirmar como objectivo da disciplina de Filosofia que os alunos reconheçam «a democracia como referente último da vida comunitária». Ora, recusando qualquer intenção antidemocrática no seu protesto, Pedro Almeida considera que este objectivo programático «implica uma certa orientação valorativa, sobretudo em termos de filosofia social e política», isto é, «implica, forçosamente, juízos de valor». Esta opção contrariaria, assim, a norma constitucional, por colidir «com o ideário de qualquer cidadão que se afirme como antidemocrata» e ainda entra em rota de colisão com a própria Declaração Universal dos Direitos do Homem, que consagra o direito de qualquer indivíduo «à liberdade de opinião e de expressão».

Mas, a adicionar a este facto, os docentes consideram que, colocando este objectivo como meta de um programa educativo, se nega «a própria natureza, carácter e essência da Filosofia». Para justificar esta conclusão dão como
exemplo a própria obra de Platão, A República, onde o ideal democrático é profundamente criticado e sobre o qual «os professores de Filosofia não podem e não devem ensinar se Platão tinha ou não razão». Sublinhando que «não se trata, evidentemente, de fazer juízos de valor de carácter negativo sobre a democracia», a fundação quer deixar claro que, em Filosofia, «o professor prepara e orienta o aluno, nunca emitindo quaisquer juízos de valor». O reconhecimento, ou não, da democracia como «referente último da vida comunitária terá de ser uma opção absolutamente livre do aluno e nunca
vir de fora», diz Pedro Almeida. Muito menos pode ser «finalidade de um programa de uma disciplina», conclui.

[...]

R.P.L.


 
Não aprenderam nada

Dizem-me que o Governo quer colocar Portugal com a hora da Europa Central.

Pequenos problemas:


  • Portugal não está na Europa Central.
  • Já passamos por isto antes. Não resultou. Voltar à hora antiga foi uma das poucas promessas que o Guterres cumpriu.
  • Há mesmo quem acredite que um país 10 milhões de pessoas com as horas trocadas pode colher benefícios económicos disso.
  • Alguém está a esquecer-se dos custos invisíveis pagos por todos, principalmente pela esmagadora maioria que não tem negócios com a Europa.
  • Ninguém impede os srs que têm negócios com a Europa de acordarem mais cedo que o resto da população. Não temos é que acordar todos à mesma hora.
  • Actualmente, Portugal tem a mesma hora que a Irlanda e a Inglaterra.
  • A Espanha tem a mesma hora que a Europa Central, mas não é por acaso que eles têm uns horários diferentes dos nossos.


  • segunda-feira, setembro 15, 2003

     
    Outro jornalista que estava lá

    A primeira flash mob portuguesa teve 3 pessoas e pelo menos 2 jornalistas. O do DN também estava lá

     
    Constituição II

    Deputado do PS Luís Nazaré concorda com o Liberdade de Expressão:

    Luís Nazaré, dirigente nacional do PS, defende uma alteração da Constituição da República. Falando ao DN a título pessoal, como fez questão de acentuar, este membro do Secretariado socialista lamenta que a lei fundamental do País tenha quase 200 artigos.


    «Considero o texto da Constituição da República demasiado longo para o meu gosto. Aliás, esse é um problema português: temos leis muito extensas e demoramos muito tempo a programar aquilo que devemos fazer»



    Há até países desenvolvidos que não têm constituições», sublinha. A actual lei fundamental portuguesa é «um texto com cariz ideológico» reconhece também o dirigente socialista, justificando este facto com o contexto histórico em que a Constituição de 1976 foi elaborada.




     
    Autopsychography IV

    (Poets feign and conceal
    So completely feign and pretend
    That the pain which they really feel
    They'll feign for you in the end

    And he who reads what they've done
    Never senses the twofold pain
    That's in them, only the one
    Which they never feel but feign

    And so, to amuse our minds
    Round again to the start
    On its circular railway winds
    That toy train called the heart.)

    —Michael Hamburger (tradutor)

     
    Autopsychography III

    Poets are people who feign
    They feign so thoroughly,
    They'll even mime as pain
    The pain they suffer really.

    Read what a poet has said --
    In the pain on the page you discern
    Not the two he had, Only one they disown.

    So on the circular track,
    To keep the mind happy, it
    Runs on, round and back --
    This clockwork train called the heart

    —Jonathan Griffin (tradutor)

     
    Autopsychography II

    The poet is a feigner.
    He feigns so completely
    That he even feigns that he is suffering
    The pains that he is really experiencing.

    And those who read what he writers
    As they read, sharply feel
    Not his double pain, but their single one

    And so, upon its toy tracks,
    Runs around, diverting reason
    The wound-up mechanical train
    That goes by the name of heart.

    —Ernesto Guerra Da Cal (tradutor)

     
    O jornalista estava lá


    Primeira flash mob portuguesa reúne 3 pessoas.

    À atenção do ministério da cultura. Se a sociedade civil não consegue organizar uma flash mob decente, o estado tem que intervir.

    domingo, setembro 14, 2003

     
    Cruzes Canhoto elogia o liberalismo

    O J está a transformar-se lentamente num liberal. Vejam só o que ele escreveu:

    A tal eu acrescentaria também o exemplo da Europa quinhentista. Após os movimentos protestantes, os estados tiveram duas opções. Uns, como o Sacro Império e a Inglaterra antes de Isabel I, fizeram o que era óbvio e natural e mergulharam em grandes matanças religiosas. Os segundos, como a Holanda, os colonos americanos e a Inglaterra pós-Isabel I, tiveram a ideia peregrina que passar a rezar cada um para seu lado e ganhar dinheiro em conjunto. A ideia funcionou tão bem que os restantes países vizinhos tomaram nota. Depois foi bola de neve. J


    É uma ideia brilhante, de facto. Nem tu me obrigas a ter a tua religião nem eu te obrigo a teres a minha. É também uma solução imparcial. A única solução imparcial. E é uma solução puramente liberal.

    É uma solução que pode ser utilizada para resolver outros problema.

    Não precisamos de adoptar todos o mesmo sistema económico. Eu opto por aderir a uma cooperativa e tu optas por criar uma empresa.

    Não precisamos de adoptar uma única moeda. Eu opto pelo escudo, tu pelo euro.

    Não precisamos de falar uma única língua. Eu falo português, tu Mirandês.

    Não precisamos de aderir todos ao mesmo sistema educativo. Tu adoptas o teu, e eu o meu, e cada um paga o seu.

    Não precisamos de aderir todos ao mesmo sistema de segurança social. Cada um poderá escolher o seu.

    Não precisamos de ver (e pagar) todos as mesma televisão pública.

    E estas ideias também colocam em causa a necessidade de constituições com orientações detalhadas sobre como devem ser resolvidos os mais importantes problemas políticos.


     
    Van Krieken no Expresso


    A notícia de primeira principal do Expresso é uma notícia sobre um artigo de opinião.

    O artigo de opinião do nosso conhecido Van Krieken não é um artigo de opinião, é uma descrição de alegados factos.

    Alegados factos que foram publicados pela primeira vez no Blog-que-ninguém-linka. Já não é a primeira vez que Van Krieken publica artigos previamente publicados no Blog-que-ninguém-linka.

    Por alguma estranha razão, o Expresso resolveu credibilizar Van Krieken, o Blog-que-ninguém-linka e, indirectamente, as acusações graves que este Blog faz ao patrão do Expresso e a uma das jornalistas do Expresso. Ou seja, o Expresso resolveu descredibilizar-se.

    Quem lê o Blog-que-ninguém-linka tomará a capa no Expresso como uma confirmação de todas as informações divulgadas nesse Blog. Ninguém colocará a hipótese de as notícias terem a mesma origem e que a publicação no Expresso (e repetição na SIC) não lhes confere nenhuma credibilidade adicional.

     
    Contributo liberal para o dilema sueco

    Já que uma parte dos suecos quer o euro, e a outra parte não quer o Liberdade de Expressão propõe uma solução liberal para este problema: Quem gosta do euro que use o euro. Quem gosta da Coroa que use a Coroa. Amigo não empata amigo.

     
    Se não queriam esta resposta, porque perguntaram?

    Parece que alguém teve a infeliz ideia de perguntar aos suecos se queriam entrar para o Euro.

     
    Constituições I

    O PG do Bloguítica Nacional diz que as constituições não podem ser neutras porque são formadas por um conjunto de opções que revelam determinadas linhas de orientação.

    À partida isto é verdade. As constituições nunca são neutras. Expressam valores. Mas há umas que são mais neutras que outras e as boas são muito mais neutras que as más.

    Uma coisa é uma constituição que garante a liberdade e a igualdade perante a lei. Outra, é uma constituição que garante a liberdade e a igualdade perante a lei e que promove o socialismo e o ensino gratuito. A primeira é uma constituição que garante direitos negativos, os quais são perfeitamente compatíveis entre si. A segunda é uma constituição que procura garantir direitos positivos, os quais são contraditórios entre si e com os direitos negativos.

    Uma constituição que garante apenas direitos negativos é uma constituição que trata todos os membros da sociedade e todas as correntes ideológicas de forma imparcial. A constituição não determina o futuro da sociedade, o qual permanece em aberto. Não impede que os indivíduos prossigam os seus objectivos como entenderem.

    Uma constituição que garanta direitos positivos, corre o risco de se tornar rapidamente, ou um obstáculo ao desenvolvimento da sociedade ou num documento oco. De que nos serve que a Constituição garanta que “Todos têm direito à educação e à cultura.”? Nada. Porque isto não é para levar a sério. Só é educado e culto quem estuda e trabalha para isso. De que serve “Estabelecer progressivamente a gratuitidade de todos os graus de ensino” se o ensino tem custos e esses custos serão pagos por alguém algures?

    A Constituição de 1975 é uma constituição marcada pela época e por uma relação de forças conjuntural. Foi uma oportunidade que uma determinada esquerda teve para impor a sua visão do mundo a todos os portugueses, gerações futuras incluídas. Não é a Constituição mais neutro que se pode fazer. É uma das menos neutras. E por esse motivo foi sofrendo modificações que a tornaram cada vez mais neutra. Mas é óbvio que ainda sobram algumas orientações socialistas na Constituição. Essas orientações podem ser retiradas sem que seja necessário lá introduzir orientações de sinal contrário.

    Conclusão: as constituições não são neutras, mas podem ser tão imparciais quanto possível. E é desejável que assim seja para que as constituições não consagrem os valores de maiorias temporárias e para que as maiorias não imponham os seus valores quer às minorias quer às gerações futuras.

     
    11 de Setembro atrasado


    O exército da Guiné Bissau acaba de derrubar o presidente democraticamente eleito Kumba Ialá. É um novo Chile.

     
    Cruzes Canhoto e o liberalismo II

    Em resposta ao primeiro post desta série, diz o Cruzes:

    O que li sobre o assunto, deu-me ideia que o capitalismo era um sistema fundamentalmente económico, baseado nas empresas privadas e sua liberdade de comércio.


    O Cruzes apresenta uma definição de capitalismo como muitas outras que existem por aí. Mas essa não é a definição liberal de capitalismo. Para os liberais, capitalismo é o sistema económico em que todos os indivíduos têm liberdade económica. E a liberdade tem que ser igual para todos os indivíduos, sejam eles accionistas de empresas ou trabalhadores individuais. Estejam eles organizados em cooperativas ou em sindicatos. A liberdade económica deve ser a liberdade para todos, e não a liberdade só para alguns. Não é a liberdade das empresas ou dos capitalistas que interessa. É a liberdade de todos e cada um dos indivíduos. A liberdade económica de um trabalhador é tão importante para o capitalismo liberal como a liberdade económica de um banqueiro.


    E por isso é que o capitalismo (liberal) é indissociável das democracias liberais. Não pode haver liberdade económica sem liberdade política por dois motivos:

    - nas ditaduras, a elite que controla o estado acaba sempre por ter mais direitos económicos que o resto da população.

    - os indivíduos não separam as suas preferências políticas das suas preferências económicas. Colocam os valores políticos e os económicos na mesma escala de valores e por isso a falta de liberdade para cada um fazer escolhas políticas interfere nas escolhas económicas. Por exemplo, numa democracia liberal eu posso escolher entre comprar uma televisão ou contribuir para uma causa política da minha preferência. Ou seja, posso converter um valor económico (o meu dinheiro) num valor político (a causa em que acredito). Numa ditadura não posso;

    As ditaduras, mesmo as mais benévolas, tomam sempre medidas políticas que têm profundo impacto económico e que limitam a liberdade económica. As mais óbvias são as medidas relacionadas com os limites à liberdade de expressão. Estas medidas têm um profundo impacto na circulação de ideias e informação na sociedade, e a livre circulação de ideias e de informação é essencial para a inovação e o progresso económico.

    Claro que as ditaduras não se ficam pela interferência no mercado da informação e tendem a controlar toda a economia, muitas vezes até aos mais ínfimos detalhes. Os ditadores optam sempre por controlar as empresas mais importantes, as importações, o turismo e o investimento externo porque a liberalização destes sectores contribuem sempre para alterar os equilíbrios que mantêm a ditadura. O ditador tende também a controlar os sindicatos e outras organizações sociais.

    O Chile de Pinochet é um exemplo de um país onde as ideias liberais foram aplicadas pela metade. Grande parte dos serviços do estado foram privatizados, mas isso foi feito numa sociedade em que a parte mais pobre da sociedade não tinha influência política. O resultado foram intervenções na economia profundamente anti-liberais destinadas a proteger as empresas privadas. O estado manipulou a moeda para atingir determinados objectivos macro-económicos, limitou severamente os direitos dos trabalhadores e usou fundos públicos para salvar empresas privadas da falência.

    O Chile de Pinochet não era uma democracia nem era um país capitalista. Não era capitalista porque o poder absoluto do estado controlava toda a economia e as medidas liberais poderiam ser invertidas a qualquer altura, como de facto foram em vários momentos. Muitas das medidas económicas foram medidas liberais, mas outras foram profundamente anti-liberais.

    O saldo macroeconómico parece ter sido positivo, pelo menos a médio prazo e em comparação com outros países vizinhos. Mas esse saldo teve custos invisíveis. Esses custos invisíveis foram pagos pelos indivíduos que foram impedidos de exercer as suas preferências, quer políticas, quer económicas ao longo de quase 20 anos.

    Da mesma forma, os índices sócio-económicos de Cuba também têm um preço escondido. São índices que só são possíveis em ditadura. São índices que resultam da submissão das preferências individuais à vontade de uma elite dirigente. Uma ditadura pode dar-se ao luxo de colocar à frente da lista de prioridades dois ou três índices, ignorando todas as outras preferências da população. Grande parte da população tem bons cuidados de saúde, mas se calhar preferia cuidados de saúde um bocadinho piores e transportes um bocadinho melhores. Ou um bocadinho menos de educação e electrodomésticos um bocadinho melhores. Ora, numa democracia liberal, a fracção do rendimento nacional de que os indivíduos dispõem é bastante maior, e a distribuição dos gastos reflecte muito melhor as preferências individuais do que as preferências dos dirigentes. (A propósito, porque é que os países de leste passaram a ganhar menos medalhas em eventos internacionais?)


    (Nota: como é óbvio, as definições são arbitrárias. Ver o que a Wikipedia tem a dizer sobre o capitalismo)

    sábado, setembro 13, 2003

     
    Técnicas jornalisticas

    1. "Um alto funcionário da empresa A, que se formou na instituição B e que está ligado ao partido C tem ligações ao processo D. Nós não vamos dizer quem é, mas se você ainda não topou é porque anda a leste disto tudo"

    2. "Um dirigente do partido X está a ser investigado porque terá uma ligação ilicita com um arguido preso do processo Y. Nós não vamos dizer quem é, mas o leitor só não descobre de quem estamos a falar porque anda a dormir"

    3. "Um alto dirigente da Administração pública está envolvido no escandalo E. Nós não vamos dizer quem é porque somos um Jornal de Referência, mas quem quizer saber é basta ler o tablóide X ou o blog-de-que-todos-falam-mas-ninguém-linka."

     
    Autopsicografia

    O poeta é um fingidor.
    Finge tão completamente
    Que chega a fingir que é dor
    A dor que deveras sente.

    E os que lêem o que escreve,
    Na dor lida sentem bem,
    Não as duas que ele teve,
    Mas só que éles não têm.

    E assim nas calhas de roda
    Gira, a entreter a razão
    Ésse comboio de corda
    Que se chama o coração

    —Fernando Pessoa

     
    Self-Analysis

    The poet is a forger who
    Forges so completely that
    He forges even the feeling
    He feels truly as pain

    And those who read his poems
    Feel absolutely, not his two
    Separate pains, but only the
    Pain that they do not feel

    And thus, diverting the
    Understanding, the wind-up
    Train we call the heart
    Runs along its track.

    —George Monteir (tradutor)

     
    The poet fancying each belief

    The poet fancying each belief
    So wholly through and through
    Ends by imagining the grief
    He really feels is true.

    And those who read what he has spelt
    In the read grief feel good--
    Not in the two griefs he has felt,
    But one they never could.

    Thus to beguile and entertain
    The reason, does he start,
    Upon its rails, the clockwork train
    That's also called the heart.

    —Roy Campbell (tradutor)

     
    Autopsychography

    The poet is a fake.
    His faking seems so real
    That he will fake the ache
    Which he can really feel.

    And those who read his cries
    Feel in the paper tears
    Not two aches that are his
    But one that is not theirs.

    And so in its ring
    Giving the mind a game
    Goes this train on a string
    And the heart is its name.

    — Keith Bosley (tradutor)

     
    Censura prévia II

     
    Pedro Mexia tem razão

    aqui (post a negrito)

     
    Liberalismo segue dentro de momentos

    e as discussões também ...

     
    Parabéns


     
    Bem vindos

    Barnabé

     
    Aos Amigos de Olivença

    Daqui não levam nada!

     
    Censura prévia


    sexta-feira, setembro 12, 2003

     
    Governo subsídia poluidores

    Governo admite pagamento faseado da comparticipação de suinicultores de Leiria. É o princípio do poluidor recebedor.

     
    Pesadelos de um Liberal

    Governo está preocupado com os resultados deportivos da Selecção Nacional.

     
    O Mundo segundo Mário Soares

    Jovens árabes pobres que vivem em sociedades pobres mas solidárias emigram para o ocidente, para estudar engenharia. Revoltados com a sua pobreza e desumanizados devido aos seus estudos em ciências exactas resolvem matar-se a si próprios e a mais alguns milhares de pessoas protestando desta forma contra a desumanização da sociedade ocidental e contra a pobreza.

    George Bush é um pobre ignorante influenciado por um tal Strauss (acho que este gajo tem um cargo qualquer na administração) e pelos fundamentalistas religiosos. Felizmente, existem pessoas inteligentes na América, como as estrelas de Hollywood, que lhe tentam fazer ver a luz.

    quarta-feira, setembro 10, 2003

     
    Cruzes Canhoto e o liberalismo

    O Cruzes Canhoto costuma criar algumas caricaturas que tendem a confundir em vez de esclarecer os vários conceitos. Não sei até que ponto o J. acredita no que escreve. A caricatura faz parte do estilo do Cruzes Canhoto. Mas, pelo sim, pelo não, o melhor é esclarecer que:

    1 - Os EUA não são um país liberal. Os subsídios à agricultura são tão maus lá como cá.

    2 - A Alemanha Nazi não era um país capitalista. Capitalismo é o sistema económico que emerge da liberdade individual, e esta liberdade é indispensável para que exista liberdade económica. A liberdade económica defendida pelos liberais não é a liberdade dos donos do capital. É a liberdade de todos os individuos. O sistema económico nazi aproxima-se mais do corporativismo, um regime em que a liberdade individual é sujeita à direcção do estado e das grandes empresas.

    3 - Os liberais não consideram que a sociedade é uma empresa ou que deva ser gerida como tal. A sociedade é uma Cataláxia e deve ser respeitada como tal.

     
    Deficit VI

    Ainda sobre as diferenças entre a alínea a) e a alínea b), o Manuel do De Direita dá uma resposta que eu não entendo:

    Para o João, pagar 1,000,000€ quando um empresa apresenta 1,000,000€ de prejuízo é igual ao pagamento de 1,000,000€ quando a mesma empresa apresenta 2,000,000€ de lucro? Tem a empresa capacidade de endividamento, e em que termos? Com que perspectivas de receitas? Vendas? Em recessão? Qual o risco de crédito aplicado pelo Banco? O milhão poderá ser o mesmo, mas tudo o resto é distinto. Elas são tudo menos equivalentes.



    A alínea a) e a alínea b) são exactamente iguais. Os pagamentos são feitos no mesmo momento algures no futuro em qualquer das alíneas. Os argumentos que o Manuel parece apresentar contra a alínea b) são válidos contra a alínea a).

    Se um corte de impostos cria deficit então o corte de impostos funciona como um empréstimo que será pago algures no futuro. Por isso, o Manuel terá que explicar porque é que o estado está disposto a emprestar esse dinheiro à economia, e os bancos não estão. O que é que o estado sabe sobre a saúde das empresas que os bancos não sabem?

    PS- Curiosamente, o corte de impostos sobre o lucro das empresas não beneficia directamente a tal empresa com 1,000,000€ de prejuízo. Essa empresa não pagaria impostos de qualquer das formas. No entanto, essa empresa, que não beneficia do corte de impostos, acabará por pagar os custos do corte de impostos mais tarde através de impostos para pagar o deficit.

     
    Cepticismo saudável II

    O PG (Bloguítica Nacional) chama-me demagogo aqui. Mas a verdade é que o PG disse:


    Citando Joao Marques de Almeida n’O Independente de sexta-feira, “o que está em jogo é demasiado importante para as demagogias e os populismos”.

    Por um momento, apesar de muito pouco provavel, vamos supor que a populacao portuguesa rejeita a Constituicao Europeia. E depois? Ja’ pensaram nas consequencias?



    Ora, o problema desta formulação é que ela não é neutra. PG usa como argumento o facto de existir à partida um resultado desejável e que o povo poderia impedir esse resultado desejável. Mas o PG poderia fazer outra formulação da mesma ideia:

    Citando Joao Marques de Almeida n’O Independente de sexta-feira, “o que está em jogo é demasiado importante para as demagogias e os populismos”.

    Vamos supor que a populacao portuguesa aprova a Constituicao Europeia. E depois? Ja’ pensaram nas consequencias?


    Porque é que o PG utilizou a primeira formulação e não a segunda? Ou então uma formulação alternativa completamente neutra:

    Citando Joao Marques de Almeida n’O Independente de sexta-feira, “o que está em jogo é demasiado importante para as demagogias e os populismos”.

    Vamos supor que a populacao portuguesa toma a decisão errada. E depois? Ja’ pensaram nas consequencias?


    Claro que a mesma frase pode ser rescrita de outra forma:

    Citando Joao Marques de Almeida n’O Independente de sexta-feira, “o que está em jogo é demasiado importante para as demagogias e os populismos”.

    Vamos supor que os deputados tomam a decisão errada. E depois? Ja’ pensaram nas consequencias?


    E já que estamos a falar disto, porque é que o PG considera provável que o povo ignorante aprove a constituição? Porque é que o povo ignorante haveria de tomar a decisão que PG considera correcta? Se o povo é mesmo ignorante não é muito mais provável que tome uma decisão aleatória e imprevisível?

    Por outro lado, PG poderia-nos explicar como é que as elites iluminadas conseguiram produzir uma cnstituição tão má ...

     
    Deficit V

    Mais uma resposta ao Manuel do De Direita:

    1-O Manuel responde incorrectamente à minha pergunta. A alínea a) e a alínea b) são equivalentes. Na alínea a), os bancos emprestam ao estado para que este cobre menos impostos às empresas. Mas como há criação de deficit, as empresas terão que pagar o empréstimo ao estado mais tarde para que o estado possa pagar aos bancos. A alínea b) acontece exactamente o mesmo, mas sem a intermediação do estado. Um corte fiscal cego pago à custa do deficit não produz riqueza nem aumenta a eficiência de nada e por isso não resolve problema nenhum.

    2 – Por isso é que o manifesto dos 115 economistas que o Manuel cita defende cortes permanentes e selectivos nos impostos e cortes selectivos na despesa do estado. Estas medidas são boas sempre, quer em tempo de recessão, quer em tempo de expansão porque racionalizam quer a cobrança de impostos quer a despesa. O Manuel não explica porque é que elas são particularmente boas em tempo de recessão. Ou seja, o que é bom naquelas medidas não é o corte dos impostos à custa do deficit mas os efeitos microeconómicos que as medidas têm na eficiência da economia. As medidas propostas servem para aumentar o peso do sector privado na economia e para redistribuir os impostos pelos vários agentes. Mas estas medidas só resultam mesmo se o estado não for forçado a subir os impostos mais tarde ou se perder margem para futuros cortes nos impostos.


    3 – O Manuel estabelece algumas relações falaciosas. A taxa de juro e o PIB variam naturalmente, independentemente do que o estado faça. A seguir a uma recessão vem sempre uma retoma. A retoma segue-se a qualquer medida que se tome na recessão, por isso é sempre possível alegar relações de causa efeito, mesmo entre medidas que prejudicam a retoma ou a economia. Correlação não implica relação causa-efeito. post hoc ergo propter hoc ?

    4 – As afirmações de Mitch Daniels sobre a taxa de juro caem na mesma falácia porque tentam provar que o deficit não provoca a subida da taxa de juro porque não há nenhuma correlação entre deficit e taxa de juro. Esse argumento só seria válido se os outros factores que influenciam a taxa de juro tivessem sido isolados. Imagine-se que a taxa de juro depende de dois factores, o deficit, D, e o facto X:

    taxa=D/X

    Se D subir e se X subir mais que D, a taxa de juro desce. No entanto, a taxa de juro teria descido mais se o Deficit tivesse descido em vez de subir. O que isto mostra é que as política do governo podem ter um efeito negativo, mas esse efeito pode ser camuflado pela evolução natural da economia.

    5- Os Estado Unidos não têm nada a ver com o Estado Liberal X que o Manuel inventou. Os EUA têm um sector público que presta serviços acima dos mínimos. Este sector pode sofrer cortes permanentes. O sector público do Estado Liberal X não pode sofrer cortes permanentes porque já atingiu a dimensão mínima.

     
    O cepticismo é saudável

    Diz o PG (Bloguítica Nacional):

    Parece-me que esta necessidade por parte dos cidadaos de referendar as decisoes politicas em jogo, em parte -- friso, "em parte" -- resulta tambem da desconfianca e de um mal-estar que existe entre governantes e governados.


    Os governados desconfiam ds governantes porque essa é a atitude mais racional que podem ter. A assimetria de informação que existe entre governantes e governados que favorece os primeiros leva os segundos a adoptar uma atitude céptica. O ónus da prova está sempre e em permanência do lado dos governantes e essa é a situação mais saudável que pode haver. A forma como o projecto de constituíção foi feito e a forma como vai ser aprovado só vem dar razão ao cepticismo dos governados.

    O PG defende que parte da população não sabe ler nem escrever. Pode até ser verdade. Mas isso não impede essa mesma população de tomar a atitude mais racional possível na sua circunstância. E na ignorância, a atitude mais racional é o cepticismo. O povo pode ser ignorante, mas não é parvo.

    O PG parece defender uma posição que eu considero extraordinária. A de que a constituição não deve ser referendada porque há o risco de o povo votar contra. De todos os argumentos que o PG poderia usar contra um referendo, este é o pior de todos. Afinal, se a constituíção não for referendada, há sempre o risco de o povo ser contra. Que risco é que o PG prefere correr? O PG prefere uma constituição reprovada porque essa é a vontade do povo, ou uma constituição aprovada apesar de o povo ser contra?

    terça-feira, setembro 09, 2003

     
    Deficit IV

    Resposta ao Irreflexões:

    1- O Irreflexões diz “E não, não acho que seja através de compras de bens de consumo, admissão de pessoal e quejandos que o Estado deve estimular a economia […]mas sim através de despesa de investimento.”

    2 – A seguir diz: “Investimento esse que, pelas suas características (elevado capital inicial, impossibilidade de consumo exclusivo, fenómeno de free-rider, etc.) só pode ser levado a cabo pelo Estado.”

    3 – Mas estas são precisamente as características que fazem dum investimento um mau investimento.

    4 – Se um investimento precisa de um elevado capital inicial, então esse investimento tem um risco demasiado elevado e não deve ser levado a cabo. (ver mais abaixo a lista de elefantes brancos da economia portuguesa).

    5 – Se um investimento é vulnerável ao fenómeno dos free-rider então esse investimento tem a sua rentabilidade comprometida, já que o estado não tem capacidade para cobrar o investimento aos beneficiários. Sendo assim, vai cobrar a todos por igual. Este tipo de situação é uma fonte de ineficiências. O investimento nunca será tão rentável como um investimento da mesma ordem de grandeza levado a cabo por privados.

    6 – Se um determinado investimento é vulnerável aos fenómenos de free rider, então esse é o problema económico que é preciso resolver. E é um problema que não pode ser resolvido pelo investimento público só porque ele é público, tem que ser resolvido por um método que force os free riders a pagar o que consomem.

    7 – O Irreflexões faz uma lista dos investimentos que o estado deve fazer: “Eu falo de construir infra-estruturas (estradas, caminho de ferro, aeroportos, portos, etc.); o meu amigo fala de comprar papel para a máquina de fotocópias. Não é bem a mesma coisa.”

    8 – Mas não se preocupa em saber se a falta de infra-estruturas é o problema principal do país. Será que são necessárias mais estradas? Mais portos? Mais aeroportos? Se são, quais? Se calhar o que faltam são fotocopiadoras, computadores, telemóveis. Aposto que alguns serviços públicos funcionariam melhor com mais uma fotocopiadora. Quem poderá saber? Se calhar são necessárias são coisas pequeninas, que dispersas por muitos lugares provocam ganhos assinaláveis de eficiência e resolvem problemas reais que as pessoas têm e não problemas imaginários que os tecnocratas inventam para justificar mais um departamento do estado. Ou se calhar o que precisamos é de métodos de organização que permitam combater os free riders.

    9 – O Irreflexões não explica como é que se distingue um bom investimento de um mau investimento. Como não existe um mercado de investimentos públicos, não existe nenhum termo de comparação que permita aferir da bondade de um investimento concreto. Como o investimento não depende da procura potencial, qualquer investimento público é justificado por valores políticos que não podem ser quantificados.

    10 – Como não existe um mercado de investimento públicos, todas as decisões são tomadas centralmente por decisores iluminados e os erros são frequentes. E quando o estado erra, erra em grande. Os elefantes brancos não nascem de geração espontânea: Cabora Bassa, Sines, Expo 98, os estádios do EURO 2004, a Casa da Música e o Alqueva estão aí para demonstrar a qualidade dos decisores públicos. A seguir vem a Taça América, o TGV e a OTA. E quem sabe, os Jogos Olímpicos.

    11 – Curiosamente, o Irreflexões defende a boa despesa, mas defende a boa despesa como antídoto para a crise. Mas a despesa do estado, para ser boa não pode estar sujeita a timings que não sejam o da racionalidade económica. O irreflexões não explica porque é que a crise é o timing que maximiza o retorno da boa despesa. Porque é que a boa despesa do estado tem um timing que está em contraciclo com aquilo que os privados acham ser a boa despesa? Quer-me parecer que a sujeição da despesa ao timing da crise é meio caminho andado para a má despesa. A ideia da despesa em contra-ciclo é a negação da ideia da boa despesa.

    12 – O Irreflexões defende o investimento público alegando o problema dos free-riders para depois defender que esse investimento deve ser feito em estradas, caminho de ferro, aeroportos e portos. E eu penso em portagens, bilhetes de comboio, taxas portuárias e aero-portuárias. Penso ainda que deviam acabar os subsídios aos transportes públicos. Penso nas portagens à entrada das cidades. Tudo soluções viáveis para acabar com os free riders.

    13 – Por outro lado, se o problema for mesmo a falta de investimento público, esse investimento deve ser feito à custa dos impostos que o estado já cobra e do deficit que o estado já tem e nunca à custa de mais deficit ou de mais impostos. O peso do estado na economia tem que descer.

    14 – A atitude do Irreflexões em relação ao estado é contraditória. Por um lado, o Irreflexões parece ter uma fé inabalável na bondade dos decisores públicos e na razão humana quando diz “Porque sei que a mão invisível falha demasiadas vezes, sabe porquê?, porque lhe falta a vista para ver para onde vai e que danos pode estar a provocar em nome da eficiência produtiva como valor em si mesmo. E o Estado pode e deve ser essa vista atenta.”. É uma fé extraordinária. Pensar que homens comuns, falíveis e limitados podem conduzir um sistema complexo como a economia na direcção desejada.

    15 –A mão invisível é o resultado da interacção de milhões de pessoas, cada uma das quais com um cérebro para pensar e com o conhecimento específico dos seus próprios interesses e da sua situação no mundo. A mão invisível não resulta da eficiência produtiva como valor supremo. Resulta dos valores que as pessoas que constituem a sociedade têm. Resulta da liberdade. Estas pessoas sabem bem para onde querem ir. Sabem mais sobre as suas próprias vidas, sobre os seus interesses, sobre as suas capacidades e recurso e sobre os seus valores que os decisores públicos poderão alguma vez saber.

    16 – Os mecanismos de mercado conjugam todo o conhecimento disperso para produzir uma inteligência emergente que supera qualquer inteligência humana. Qualquer ser humano que tente dirigir a mão invisível está a tentar manipular fenómenos que estão para além da sua limitadas compreensão.

    17 – Por outro lado, é o próprio Irreflexões que nos vem dizer que o estado é um mau decisor e que invariavelmente prefere cortar na despesa boa em vez de cortar na despesa má. Mas isso não é extraordinário. O investimento só dá lucro a médio prazo e as eleições são daqui a dois anos. Este defeito, longe de ser uma característica deste ou daquele governo, é uma característica de todos os governos. O peso da despesa má cresce sempre porque todos os governos querem resultados a curto prazo. Portanto, o problema não é tanto se o estado deve fazer uma despesa boa ou uma despesa má, mas se os decisores públicos, caso consigam distinguir a despesa boa da má, terão algum dia incentivos para fazer despesa boa.

    18 –Na discussão sobre a Irlanda, o Irreflexões critica a decisão do governo irlandês de acabar com o investimento público para baixar os impostos. O Irreflexões parece não se ter apercebido que os resultados desse tipo de políticas foram taxas de crescimento da ordem dos 8%. Ou seja, os irlandeses trocaram o tal investimento bom que o irreflexões defende por mais liberdade para o sector privado e saíram-se bem.

     
    A liberdade a que temos direito

    lido no Correio da Manhã

    A Comissão Europeia (CE) quer que os maços de tabaco vendidos no território da União Europeia passem a ostentar fotografias chocantes que exemplifiquem claramente os efeitos que o acto de fumar pode ter no corpo humano para sustentar as frases que já são impressas nos pacotes. Foi com este objectivo que a CE aprovou ontem uma decisão que abre caminho a que a partir de 1 de Outubro de 2004 o uso destas imagens seja obrigatório.

    [...]

    Isto está a fazer com que a Tabaqueira esteja a estudar novas campanhas de "marketing", como a oferta de carteiras para que os fumadores possam enfiar os seus maços e assim esconder os avisos.



    domingo, setembro 07, 2003

     
    Deficit III

    Diz o Irreflexões:

    3 - Em tempos de recessão o endividamento do Estado pode e deve aumentar como forma de estimular a retoma económica, com cujos frutos futuros se pagará o endividamento. Esse aumento deve ser moderado e na estrita medida da necessidade (o que não quer dizer que 3% seja um limite racional).


    O Irreflexões propõe que, em tempos de recessão, os bancos emprestem dinheiro ao estado para que este estimule a economia através de compras às empresas:

    bancos --> estado --> empresas

    Isto significa que após a retoma o dinheiro emprestado será pago com juros pelas empresas ao estado via impostos, e pelo estado aos bancos:

    empresas --> estado --> bancos

    O problema desta ideia é que as próprias empresas, que conhecem a sua situação económica melhor que ninguém, podem elas próprias pedir um empréstimo à banca. Se as empresas o podem fazer, então a intermediação do estado é desnecessária.

    Acontece que cada empresa tem a sua própria circunstância e algumas poderão achar racional pedir um empréstimo à banca:

    bancos --> empresas

    com o argumento de que poderiam pagar o mesmo empréstimo após a retoma:

    empresas --> bancos

    Outras poderão achar que a ideia é irracional para o seu caso e poderão optar por não pedir empréstimos. Outras ainda, poderão ser empresas inviáveis a quem a banca não concederia empréstimos. Se existem empresas que acham a ideia do empréstimo irracional, porque é que o estado haveria de forçar todas as empresas a entrar num esquema que é equivalente a um empréstimo? Se existem empresas inviáveis, porque é que o estado haveria de lhes conceder benefícios equivalentes a um empréstimo?

    Ao actuar cegamente sobre a economia através das compras, o estado compra o que não precisa a empresas em quem a banca não confia. Para fazer as tais compras, que até podem ser investimentos inúteis, precisa de pedir um empréstimo à banca causando a subida da taxa de juro.


    sábado, setembro 06, 2003

     
    Os juizes também têm vida privada



    Juiz Rui Teixeira a caminho do ginásio.




    Juiz Rui Teixeira no desempenho das suas funções.


    (este post é um comentário a este do Mata-Mouros


     
    Deficit II

    Mais um post do Manuel do De Direita:

    Um Estado X entra numa Recessão X.
    O Estado X tem um Governo Liberal X.
    O Governo X fornece os Serviços Mínimos X à População X.
    O Governo X tem uma Política Fiscal X que recolhe Receitas X para financiar os Serviços Mínimos X.
    A Recessão X faz diminuir as Receitas X.
    O Estado X é brindado com um Défice Orçamental X.
    O Governo X considera que se Baixar em Y os seus Impostos X, o Sector Económico X irá Recuperar e a Recessão X acabar.
    Se a Recessão X não acabar, as Receitas X irão diminuir Z e o Estado X apresentará um Défice X Maior do que resultaria da Baixa em Y dos seus Impostos X.
    O Primeiro-Ministro X do Governo X fala aos Cidadãos X congratulando-se pela Retoma X.
    As Receitas X Geradas pela Retoma X pagam o Endividamento X que o Governo X tomou.
    O Governo X poderia não ter decretado o Endividamento X.
    Poderia ter cortado os Serviços Mínimos X, transformado-os em Serviços Insuficientes X, hipotecando a liberdade de iniciativa X dos cidadãos X para alcançar a Retoma X.


    1- Neste post o Manuel faz uma análise da economia de um país considerando apenas relações entre grandezas macroeconómicas. Infelizmente, o Manuel não analisa as consequências microeconómicas das medidas macroeconómicas que propõe. Este problema é comum a todas as propostas de intervenção do estado na economia. Eu já tinha levantado esta objecção antes e volto a fazê-lo.

    2 - Um governo liberal não baixa impostos para beneficiar um determinado sector da economia ou para relançar a economia. Se o fizer, deixa de ser liberal e passa a ser outra coisa qualquer.

    3 - Os impostos não podem ser baixados indiscriminadamente. Os impostos têm que estar indexados aos serviços prestados pelo estado e estes serviços devem estar dimensionados de acordo com a procura. A maior parte dos serviços do estado devem provir de receitas próprias e só em último caso é que devem provir de impostos. O objectivo é fazer com que a actividade do estado se ajuste às receitas e à procura dos seus serviços. O governo liberal X, se for de facto liberal, não será brindado pelo deficit X porque terá forçosamente que adaptar-se à economia e para isso terá que ter políticas de gestão flexíveis. Os serviços mínimos X não são serviços fixos, são serviços cuja qualidade e quantidade depende da procura.

    4 - O governo liberal X não sabe qual é o efeito concreto do abaixamento dos impostos X. O abaixamento dos impostos X à custa de um endividamento do estado só é racional se a baixa de impostos compensar a consequente subida dos juros.
    Baixar os impostos é uma medida cega:

    - os impostos baixam para todos os agentes, independentemente dos serviços prestados pelo estado a cada agente;

    - os juros sobem igualmente para todos da mesma forma. Existirão sempre empresas para quem o abaixamento de impostos não compensa a subida da taxa de juros e são essas empresas que são determinantes para a retoma..

    - o estado continua a prestar os mesmos serviços, mas agora a um preço mais baixo. Não faz sentido.

    A descida dos impostos só tem um impacto positivo se for acompanhado por uma racionalização das despesas do estado. Caso contrário, o estado está a emprestar dinheiro a todos os agentes de forma indirecta e indiscriminada já que o estado voltará a cobrar o dinheiro emprestado mal comece a retoma. Neste cenário, o estado limita-se a servir de intermediário entre os bancos e os agentes económicos, com a agravante de todos os agentes económicos serem tratados por igual. Grande parte da eficiência económica provém do tratamento específico que os agentes dão uns aos outros.

    Gostava que o Manuel me explicasse as diferenças entre as situações seguintes:
    a) O estado baixa os impostos, recorre ao crédito para cobrir a queda da receita, paga o empréstimo com os impostos durante a retoma;
    b) O estado não mexe nos impostos. Os próprios agentes económicos recorrem ao crédito para pagar o excesso de impostos em relação à alínea a) e pagam o empréstimo durante a retoma;


     
    Déficit

    Diz o Manuel do De Direita:


    A génese desta discussão é um post em que critico a confusão entre a existência de um défice e as políticas Keynesianas. Como tal não estava a defender as políticas Keynesianas que o João cita no seu penúltimo parágrafo.
    "...vê em John Keynes a suprema encarnação do Mal e ao qual associam tudo quanto tenha a ver com a palavra "Défice". "

    Confusão que existe em quem tem uma obsessão persecutória por Keynes, que acaba por vê-lo onde ele pode não estar.


    Acho que esta discussão já mostrou que os argumentos contra o déficit vão muito para alem das críticas às políticas keynesianas. Os limites ao déficit servem como limites ao poder do estado. O estado tem uma tendência natural para crescer de forma descontrolada e a desperdiçar dinheiro. Coisas que a Public Choice explica. Os limites constitucionais ao déficit são uma proposta que tem como objectivo limitar esse crescimento e forçar o estado a racionalizar os gastos.

    O Manuel defende que os investimentos do estado devem ser reprodutivos e que tudo corre bem "se o Governo em período de crescimento não for liderado por um irresponsável como António Guterres". Esta tese tem dois problemas:

    - Ninguém sabe à partida o que é um investimento reprodutivo. Essa é a maior das dificuldades económicas. Se nos fosse dado a conhecer á partida o que é um bom investimento reprodutivo, ganhariamos todos uma pipa de massa. Não é por acaso que o país está cheio de elefantes brancos sem quaisquer efeitos reprodutivos. O Manuel defende aqui a tese racionalista segundo a qual um governo tem a capacidade tomar as escolhas fundamentais que determinam a vida de milhões de pessoas sem falhar.

    - Pessoas como António Guterres têm mais probabilidades de ser eleitas em tempo de vacas gordas que o estadista omnisciente capaz de tomar as decisões correctas. O tal estadista omnisciente nunca ganha eleições, primeiro porque não existe, e depois porque os eleitores são facilmente enganados pelas promessas eleitorais de políticos como Guterres.

    Em resumo: devem existir sempre limites ao déficit, porque políticos como António Guterres chegam com demasiada frequência ao governo. Os erros cometidos por Guterres vão ser cometidos outra vez, mais cedo ou mais tarde, e eu suspeito que seja mais cedo do que se pensa. As próximas eleições são já em 2006 e o governo não vai resistir e vai utilizar a despesa do estado para criar uma sensação artificial de enrequecimento nos eleitores.


    quinta-feira, setembro 04, 2003

     
    anti-keynesianismo fundamentalista III

    Resposta ao Manuel do De Direita

    Se o argumento é esse, e nos esquecermos da bondade ou não do investimento, o argumento não é correcto e é uma má medida de gestão. Se há algo que faz todo o sentido é o recurso ao crédito. Aumentando o custo total mas distribuido pelo tempo e futuras receitas o pagamento da dívida. É este o comportamento das famílias e das empresas. Torna possível um desenvolvimento impossível por "fundos próprios". Os custos do crédito são inferiores às futuras receitas que ele propicia.


    O estado não é um agente económico como os outros. Devia ser o árbitro, mas é ao mesmo tempo jogador e árbitro. Um árbitro que dispõe do uso da força e que pode mudar as regras do jogo quando lhe convém. Praticamente não existem limites “naturais” ao endividamento do estado porque as receitas futuras do estado não dependem da qualidade dos seus serviços, mas da sua capacidade para mudar as regras do jogo a seu favor. O estado pode mudar a lei, inflacionar a moeda e subir os impostos, instrumentos de que mais nenhum agente económico dispõe. Como não existem os tais limites “naturais”, o estado pode endividar-se de forma irracional porque não terá que sofrer as consequências dos seus erros no futuro. Os estados não podem ir à falência. Haverá sempre uma solução que passa normalmente por sugar recursos à economia. Por isso é que devem existir sempre limites ao endividamento do estado. Dívidas do estado elevadas são uma ameaça à liberdade futura dos cidadãos.

    Se em tempo de crise os custos do crédito fossem inferiores às futuras receitas que ele propicia andava toda a gente a endividar-se. O problema é que os keynesianos defendem que o estado deve agir sempre em contra-ciclo, fazendo a cada momento aquilo que os outros agentes consideram irracional.

    Em geral, os argumentos a favor do deficit ignoram os efeitos microeconómicos das medidas. Não existe uma receita universal para a política de endividamento óptima. As políticas de endividamento dependem das preferências subjectivas dos agentes individuais. Cada agente tem as suas próprias preferências temporais. A intervenção maciça do estado no mercado de capitais deturpa o mercado num determinado sentido, como se todos os agentes tivessem as mesmas preferências. O peso do estado na economia deve por isso ser substancialmente reduzido de modo a que o estado não represente as preferências de todos por igual.

    Isto está relacionado com um dos argumentos do Economist:

    One is that bigger deficits push up interest rates, crowding out private investment and curbing growth. That is true in the long run, but not when economies have a huge amount of slack and firms have little desire to borrow


    Este argumento pressupõe que todos os agentes podem ser tratados por uma média. Como em média ninguém se pretende endividar, conclui-se que se as taxas de juro subirem não há problema nenhum. O que o argumento ignora é que alguns agentes estão mais interessados que outros em expandir os seus negócios. Estes agentes são precisamente aqueles que tomaram decisões acertadas antes da crise, que anteciparam a crise e que agora estão em posição de expandir os seus negócios e de ultrapassar os seus concorrentes. São estes agentes que estão em condições de iniciar a retoma. Ao endividar-se agora, o estado está a deturpar o mercado de capitais e a fazer com que o capital vá para actividades públicas que não passam de paliativos inúteis.

    Normalmente, os investidores só emprestam dinheiro aos agentes que demonstrem ter um plano de negócios racional. No entanto, no caso do estado, os investidores emprestam mesmo que o plano de negócios não seja racional porque o estado dá outras garantias que nada têm a ver com racionalidade poque o estado pode manipular as regras do jogo.

    Pode o Estado gastar exactamente o mesmo que no ano X-1, e apresentar um défice orçamental sem ter "injectado" mais um centavo que seja na economia em relação ao ano anterior. O que o The Economist fala e eu subscrevo, é qual a atitude a ter nesse momento.


    Mas se todos os agentes reduzem as despesas, porque é que o estado deve manter os mesmos gastos que no ano anterior?


    Num momento de recessão, qual a racionalidade de um Estado aumentar os impostos para equilibrar o Défice se o mesmo Estado tem capacidade de endividamento? Aumentar os impostos é agravar as condições que o mercado tem para reagir, para inovar, para voltar a crescer.


    O problema não está na racionalidade do aumento de impostos, o problema está na racionalidade da manutenção das despesas quando as receitas baixam. Nenhum outro agente económica faz isso.


    Uma vez mais é essencial debater a natureza da crise. É ela criada por um sector económico obsoleto? E se for por uma crise energética? Ou por mudanças nas Leis do Comércio Internacional? Qual a lógica do Estado agravar as condições de competitividade e investimento das empresas, limitar a sua capacidade de reacção?



    Se a crise for causada por uma crise energética, o estado não deve intervir. Tal intervenção só servirá para esconder os sintomas da crise, o que contribui para que os agentes económicos não lidem com as suas causas. Se se der uma crise energética, o mercado tem que se reestruturar para responder à crise. As empresas têm que passar a recorrer a soluções inovadoras para o problema: energias alternativas, meios de transporte mais eficientes, poupanças em áreas não essenciais, abandono de actividades que se tornaram economicamente inviáveis. As intervenções estatais só servem para impedir os reajustamentos necessários. Um argumento semelhante pode ser construído para o caso de mudanças nas leis do comércio internacional. Qualquer mudança exige uma reestruturação do tecido económico, as intervenções do governo adiam as reestruturações necessárias e introduzem irracionalidades.

    A solução é sempre a mesma, qualquer que seja a natureza da crise. Os agentes económicos devem sentir a crise para que possam tomar as medidas de reestruturação necessárias. Quando o estado intervém, envia sinais falsos aos agentes económicos levando-os a tomar decisões irracionais.



    .
    O que aqui pretendi foi quebrar o maniqueísmo na análise do défice orçamental. Até podia defender um choque fiscal, que no curto prazo se traduz no agravamento do défice sem "injectar" um tostão em investimento público. Mas aquilo que defendo é o não agravamento das condições de competitividade que o Estado propicia através dos seus instrumentos num momento que já é de recessão.

    E nisto estamos em acordo ou em desacordo?


    Talvez haja aqui uma confusão com a questão do keynesianismo. O keynesianismo defende intervenções directas do estado na economia para incentivar a actividade económica. Estes incentivos só são possíveis se o estado tirar de uma lado para pôr noutro. Ou sobe os impostos para aumentar os incentivos, ou se endivida. Não há mais alternativas e nenhuma delas é boa.

    Outro problema, que pouco tem a ver com keynesianismo, é o aumento do deficit como consequência de compromissos anteriormente assumidos pelo estado. Neste caso não há nenhuma tentativa deliberada de manipular a economia, mas apenas uma necessidade de o estado responder à quebra de receitas. A solução também não pode passar nem pelo endividamento, nem pelo aumento dos impostos. A solução tem que passar pela racionalização e pela adequação da despesa à receita.

     
    Estatísticas de analfabetismo

    Diz o Cidadão Livre

    Tendo sido noticiado ainda recentemente que, apenas na zona norte do país, existem ainda 8% da população activa que não sabe ler nem escrever(!!), não deveria o Estado assumir um compromisso concreto de eliminar tal flagelo no prazo, por exemplo de 5 a 10 anos?
    Mão de obra para tal tarefa parece que não falta.



    O analfabetismo em Portugal é um problema geracional que afecta a população mais idosa, a maior parte da qual não faz parte da população activa nem está interessada em aprender a ler. Existem programas de educação de adultos e qualquer pessoa que voluntariamente queira aprender a ler e a escrever pode fazê-lo. Para alem disso, existem milhares de professores no quadro que têm horários zero e outros que estão destacados em sindicatos.

    Os problemas de desemprego de um determinado grupo não podem ser resolvidos à custa de serviços fictícios de que ninguém precisa, mas que todos pagam. Existe neste momento um desajuste entre a oferta e a procura de professores que se deve às más decisões tomadas por individuos no passado. Esses individuos tomaram determinadas opções na vida de livre vontade. Erraram. Escolheram a profissão errada. Não cabe ao estado corrigir esses erros com outros ainda mais trágicos.

    quarta-feira, setembro 03, 2003

     
    anti-keynesianismo fundamentalista II


    Blogs que entraram na discussão do déficit:

    Desesperada Esperança

    Novo posto no De Direita


    Veto Político


    O Cataláxia tem alguns argumentos que respondem a alguns dos argumentos do De Direita.

    Dois blogueadores enviaram-se os artigos do Economist. Muito obrigado.

    (continua)

     
    Pedro Mexia voltou

    outra vez.

     
    Lomborg por Lomborg II

    [...] the effect of the Kyoto protocol will be marginal – even if we assume that the Kyoto emission ceiling will be kept in place indefinitely […]. Several models have calculated that the consequence of Kyoto will be a temperature increase by 2100 of around 0.15 o C less than if nothing had been done […]

    Bjorn Lomborg in "The Skeptical Environmentalist".

    terça-feira, setembro 02, 2003

     
    Lomborg por Lomborg

    A propósito deste comentário do Cruzes Canhoto a esta notícia no Público :

    Basically, there is no disagreement that the centuries before 1900 were much colder. This phenomenon is well known in history as the “Little Ice Age”


    Likewise, the early part of Mann data indicates a slightly warmer climate, some periods of which could even be on par with the mean twentieth temperature. Again, there is no disagreement that the early part of the second millennium was warmer [than the Little Ice Age], a period known as the “Medieval Warm Period”.

    […] tree ring data […] are naturally limited to land data. Which means that they do not describe temperature of the more than 70% of the Earth’s surface covered by oceans.

    Growth of trees are dependent on many other factors besides temperature […]

    trees mainly grow in summer and during the day-time, which means that they do not realiably measure full, annual temperature.

    Thus, the available data […] seem to indicate that there is considerable disagreement about the actual development in temperature.

    Consequently, a recent status report concludes that “at present, it is debatable whether there is enough temperature proxy data to be representative of hemispheric, let alone global temperature”.

    There is no doubt that the temperature of the late twentieth century is greater than many previous centuries, but this cannot be taken as a simple indication of overwhelming global warming as we are also coming out of a Little Ice Age.

    The claim that the temperature is higher now than that at any time throughout the past 1000 years seems less well substantiated, as the data essentially exclude ocean temperatures, night temperatures and winter temperatures […]

    Bjorn Lomborg in "The Skeptical Environmentalist".

     
    anti-keynesianismo fundamentalista

    Diz o Manuel do De Direita

    O The Economist descreve de forma simples, natural e descomplexada porque é que um défice não é assustador em períodos de recessão, antes pelo contrário pode ser uma óptima medida.

    Algo que me parece só poder ser negado por fundamentalismo de uma determinada corrente académica que vê em John Keynes a suprema encarnação do Mal e ao qual associam tudo quanto tenha a ver com a palavra "Défice".



    Infelizmente, não tenho acesso aos artigos do Economist, e por isso só posso fazer comentários gerais.

    O Manuel chama fundamentalista à corrente académica anti-Keynesiana. Mas o que é que isto significa exactamente. O que significa chamar fundamentalista a um cientista? Das duas uma, ou um cientista está certo, ou está errado. E os keynesianos, ou estão certos ou estão errados. Não há meio termo possível. E há quem ache que eles estão errados, da mesma forma que os keynesianos acham que estão certos. Porque é que uns são chamados de fundamentalistas e os outros não? O que é um fundamentalista em ciência?

    Os argumentos contra as políticas keynesianas parecem-me bastante sólidos e normalmente nem sequer são discutidos em debates públicos. Normalmente, keynesianos nem sequer apresentam argumentos que respondam às objecções dos ainti-keynesianos. Isto acontece porque enquanto o keynesianismo é intuitivo, os anti-keynesianismo é contra-intuitivo.

    Os keynesianos defendem políticas de contra-ciclo. Intuitivamente, isto faz sentido. Quando a economia está em recessão, o estado injecta dinheiro na economia impedindo que as falências e os despedimentos. E não duvido que resulte. E por isso é que o keynesianismo é tão popular.

    O anti-keynesianismo não é tão intuitivo. Não é intuitivo porque enquanto as vantagens do keynesianismo estão concentradas e têm vantagens de grande visibilidade, as desvantagens estão dispersas no tempo e no espaço e não têm visibilidade.

    O keynesianismo serve para esconder os sintomas da doença. As falências de empresas, os despedimentos e a queda da taxa de lucro são uma consequência das más decisões que causaram a crise. As medidas keynesianas impedem que esses sintomas se manifestem. Ao impedirem os sintomas, as medidas keynesianas impedem o mercado de se auto-corrigir perpetuando os comportamentos que geraram a crise. A doença continua lá, mas podemos fingir que não está. Quando a crise acaba a doença traduz-se em crescimentos mais lentos.

    Por outro lado, quando o deficit do estado terá que ser pago um dia. Os deficits elevados causam custos a médio prazo. Se o estado aumenta agora o deficit, terá que aumentar os impostos ou reduzir as despesas mais tarde. Esta política acaba por se reflectir em crescimentos mais lentos a médio prazo.





    segunda-feira, setembro 01, 2003

     
    esquerda Cassandra

    A não perder, Vasco Rato critica a esquerda Cassandra a propósito do Iraque. (link via Bloguitica Nacional)

     
    Ser e parecer

    1 - Marcelo Rebelo de Sousa dizia ontem que não basta que um juiz seja imparcial, é preciso que também pareça imparcial;

    2 - No entanto, uma decisão imarcial nem sempre é intuitiva. Uma decisão imparcial pode ser contraintuitiva;

    3 - Par alem disso, Uma decisão tem que se basear em quantidades abissais de informação que o púlico desconhece;

    4 - Segue-se que uma decisão imparcial só por acaso é que intuitiva e só por acaso é que parece imparcial aos olhos do público;

    5 - Por outro lado, é mais fácil tomar decisões que parecem imparcias, bastando para isso ir ao encontro da noção de imparcialidade do prof. Marcelo, do que tomar decisões que são de facto imparciais. As decisões que são de facto imparciais só podem ser tomadas após longas horas de análise dos factos concretos desconhecidos do público e do Prof. Marcelo.

    6 - Acresce a tudo isto que errar é humano, e só não erra quem não tem que tomar decisões.

    7- Das decisões de um juiz é sempre possível seleccionar as mais controversas, de preferência aquelas que são mais contraintuitvas ou aquelas sobre as quais o público desconhece dados chave, e fazer disso um cavalo de batalha. Com esta técnica é sempre possível denegrir a imagem de um juiz excelente.

    8- Curiosamente, as decisões do juiz Rui Teixeira têm sido muito constestadas em público, mas têm sido sempre confirmadas pelos tribunais superiores.

    9 - Mas os advogados de defesa podem continuar a tentar porque um dia, após tantos recursos, após tanta papelada, alguém acabará por cometer um erro grave e o processo poderá ser finalmente anulado por uma formalidade qualquer.

    10 - Isto faz lembrar aqueles alunos universitários que após tantos exames à mesma cadeira acabam finalmente por ter 8,5. 8,5 como se sabe é 9 e ninguém reprova com 9. Este método é particularmente eficaz nas cadeiras com testes de múltipla escolha. A teoria das probabilidades diz-nos que o aluno que responde aleatoriamente a todas as perguntas acabará um dia por ter 8,5.